Cantata Italiana
Sergio Vianna (*)
Nesses dias bicudos de prisões televisivas subordinadas à lógica da barbárie, tais fatos nos levam a tempos que pensávamos superados, como o da Inquisição. Não tem jeito, a gente vai se enganando enquanto acredita na evolução da maioria dos homens. Basta, porém uma recaída ao falso discurso moralista de nossas elites de sempre para acordarmos numa realidade cruel já instalada.
Lembro, entretanto que sempre haverá um dia depois da noite assustadora. Na expressão da dor concomitante à prisão injusta de Genoíno, por exemplo, veio à luz um fato que pareceu inusitado, embora estivesse à nossa frente e bastante visível: a ida de Pizzolato para a Itália.
A saída para terras italianas não mudou o humor, registro necessário. Houve, no entanto um insólito acendimento de uma pequena luz ao final desse túnel repleto de trem fantasma. E se a Justiça italiana resolver examinar a falsa denúncia? Não estariam nossos supremos juízes em risco iminente de uma exposição ridícula pelas suas ridículas decisões ilegais e estapafúrdias?
Dezenas de advogados e centenas de requerimentos e memoriais defenderam a tese do reexame prudencial do objeto pelos supremos senhores ministros. Alertaram – exaustivamente – para a necessária tarefa da boa fé e da razoabilidade, indicando-lhes o indispensável confronto real entre fatos e documentos com a representação acusatória que se demonstrava frágil. Sem dizer que outros milhares de blogueiros, jornalistas, intelectuais, acadêmicos, professores e trabalhadores produziram – durante um razoável período – o mesmo pedido de comedimento.
Ouvidos moucos produzem olhar vesgo e pensamento sinuoso. Ao não darem a menor pelota a tantos lembretes, nossos supremos juízes optaram pelo risco, aquele em que um tribunal italiano possa lhes pedir explicações e fundamentos para a denúncia e repressão aos réus levados – sob pompa e circunstância – ao espetáculo midiático da prisão.
Mais que a exposição internacional incômoda será o desmonte da trama kafkiana, destruindo o arietino engenho fálico que produziu tamanha barbárie jurídica a compor a conveniência de uma elite entorpecida pelo ódio, livrando todos os julgados e condenados que foram acusados pela mesma inautêntica incriminação.
Pouco se me dá se nossos supremos se mostrarão uns onagros. Apavora-me muito mais que o maior órgão público de nosso judiciário seja levado à sarjeta da indigência moral e assim contribuir para o aumento da síndrome de vira-latas que campeia o pensamento do indivíduo sem rumo político, situação que leva à degradação dos valores necessários ao acatamento do papel de nossas instituições republicanas.
E a melhor consequência seria o fim das injustiças cometidas contra pessoas que estavam num embate político, e que sob qualquer razão lógica não deveriam ser submetidas à humilhação e execração públicas, mas foram. Antes de a Itália agir, se é que o fará, há uma esperança em nossas próprias autoridades judiciais, as mesmas que cometeram esse latrocínio processual, que é o julgamento do processo que está sob a relatoria do ministro Lewandowski, depois de dormitar anos na gaveta do “segredo de justiça” decretado pelo Joaquim Barbosa. É lá que repousam em berço esplêndido os documentos mais contundentes que eliminam a hipótese de fraude criada por Gurgel e Barbosa na AP 470, escondidos que foram exatamente para a produção dessa hipocrisia que assistimos em toda a mídia canhestra dessa terra de lindas palmeiras, onde querem proibir o canto do sabiá. E você? Sabia que a sábia cantata do Sabiá pode ter um sotaque italiano?
(*) Sergio Vianna é funcionário do Banco do Brasil e Botafoguense.
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